Nem toda gravidez é mágica. Nem toda mãe se reconhece nos comerciais de Dia das Mães. E tem muita mulher vivendo uma maternidade real, fora da curva, sem nunca ter escutado que aquilo que ela sente também tem nome, história e pertencimento.
Foi pensando nisso que eu convidei a neuropsicóloga Camyla Guigue para uma conversa ao vivo no canal M de Maria. A ideia era simples, mas o resultado virou muito mais do que eu esperava: um especial de Dia das Mães sobre o que a gente vive, mas quase nunca tem onde contar. Um espaço sincero para falar de gravidez atípica, diagnósticos inesperados, autoconhecimento tardio e o peso invisível da culpa que parece vir de brinde com a maternidade. Um espaço onde o afeto não vem como coraçãozinho no final de uma frase clichê, mas como prática, escuta e descanso.
Camyla está grávida do primeiro filho. Ela trabalha com adolescentes e adultos neurodivergentes, tem formação em Terapia Cognitivo-Comportamental e uma escuta afiada que mistura conhecimento técnico com uma humanidade rara. Eu sou mãe neurodivergente de uma bebê de dois aninhos. Juntas, falamos de dentro da vivência e também da observação clínica. Da dor e da análise. Do riso e da resistência.
Teve um momento em que eu brinquei que, na minha gravidez, não teve aquela conexão mágica do tipo “é parte de mim”. Às vezes me sentia em um filme estilo Alien e Predador. Camyla riu. E é isso. Às vezes, a piada é o único jeito de dizer a verdade com um pouco de leveza. A gente falou sobre como muitas mulheres descobrem seu próprio diagnóstico — de autismo, TDAH, ansiedade severa — só depois que o caos da maternidade chega. Quando o corpo dá sinais, quando a mente não aguenta mais. Quando algo falha, e o que parece falhar é a gente.
Mas não é a gente. É o molde. O molde que cobra, que julga, que diz como uma “boa mãe” deve se sentir, reagir, planejar, dar conta. A mãe multitarefa. A mãe grata. A mãe que não reclama. Nós não cabemos nesse molde, e isso não significa que estamos erradas.
Falamos sobre culpa. Ah, a culpa… Aquela que chega junto com os hormônios da gestação. Não tem exame de sangue que detecte, mas a gente sente. Culpa por não amar como esperavam. Culpa por não se sentir inteira. Culpa por querer cinco minutos de silêncio. Por desejar dormir. Por não conseguir brincar. Por pedir ajuda. Por ser humana. E como a culpa, quando não reconhecida, vai virando solo fértil para vergonha.
Camyla trouxe uma fala que me atravessou: cinco minutos. Cinco minutos pra tomar um café olhando o pôr do sol. Parece pouco. Mas muda o dia. E eu pensei que às vezes a gente está tão mergulhada na urgência dos outros, que cinco minutos é o que resta do mundo inteiro. A produtividade afetiva, que eu trago no Método da Maré, tenta mudar isso: reconhecer que se cuidar é um ato criativo, é um bloco de intenção, é o tipo de produtividade que ninguém celebra em voz alta, mas que sustenta todo o resto.
Tivemos momentos em que falamos das nossas crianças também. Sobre como é desafiante, por vezes, diferenciar o que é comportamento, o que é traço, o que é necessidade. Sobre como é solitário amar de forma intensa uma criança que o mundo insiste em ler atravessado. Sobre como nós, como mães, também somos lidas de forma atravessada.
No final, eu disse uma coisa que queria repetir aqui: nem toda mãe nasce pronta. Mas toda mãe merece respeito, escuta e afeto — do mundo e de si mesma. Essa frase saiu como um fecho, mas também como um lembrete.
Se você já se sentiu fora do roteiro, fora da curva, fora do que esperavam de você — então esse vídeo é pra você.
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Porque a curva pode ser fora da média, mas o caminho ainda é nosso.
Com afeto, Maria